Procede à revisão da regulamentação dos preços de transferência nas operações efetuadas entre um sujeito passivo do IRS ou do IRC e qualquer outra entidade, ao abrigo do artigo 63.º do Código do IRC.
O regime dos preços de transferência tem como paradigma o princípio de plena concorrência, em torno do qual se foi firmando um amplo consenso internacional por se entender que a sua adoção permite não só estabelecer uma paridade no tratamento fiscal entre as empresas integradas em grupos internacionais e empresas independentes como neutralizar certas práticas de evasão
fiscal e assegurar a consequente proteção da base tributável interna.
Decorridos cerca de 20 anos desde a publicação da Portaria n.º 1446 -C/2001, de 21 de dezembro, a qual, nos termos do atual n.º 15 do artigo 63.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, regulamenta um conjunto de temas associados à aplicação do princípio de plena concorrência, e tendo em conta as alterações na legislação interna, os desenvolvimentos internacionais, verificados ao nível da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e do Fórum Conjunto sobre Preços de Transferência da União Europeia, e a
experiência adquirida com a sua aplicação, torna -se necessário proceder à sua revisão.
Esta revisão, por um lado, acompanha as alterações já introduzidas no artigo 63.º do Código do IRC, no que diz respeito, nomeadamente, ao âmbito de aplicação do princípio de plena concorrência e à adoção do método mais apropriado na determinação dos preços de transferência, e, por outro lado, acolhe os desenvolvimentos resultantes dos trabalhos da OCDE neste domínio, com particular ênfase nas regras gerais de aplicação do princípio de plena de concorrência, designadamente na delineação das operações vinculadas e na abrangência do conceito de termos e condições; na análise de comparabilidade, enunciando as principais ações na identificação de comparáveis para efeitos de avaliação da conformidade dos preços de transferência praticados com o referido princípio; na seleção e aplicação dos métodos para determinação dos preços de transferência; e na previsão de regras especificamente dirigidas para algumas operações.
No que concerne às obrigações de documentação dos preços de transferência, procede -se quer a uma reestruturação da organização do processo de documentação, com a previsão expressa
de uma dupla estrutura traduzida na preparação e manutenção de um Dossier Principal (Master File) e um Dossier Específico (Local File), na esteira das recomendações internacionais, quer a um
aumento dos limites que dispensam a organização do processo de documentação, que passam a atender a uma dualidade de critérios, aferidos em função do montante anual de rendimentos e do
montante das operações vinculadas do sujeito passivo.
Assim, e não obstante a complexidade técnica das matérias relacionadas com os preços de transferência, houve a preocupação de, por um lado, conferir maior certeza na aplicação do seu
regime e, por outro, na medida do possível e sem prejuízo de manter um elevado grau de colaboração entre os contribuintes e a administração fiscal, simplificar as obrigações acessórias que
impendem sobre as empresas, em especial as de menor dimensão, tendo em vista a redução dos seus custos de contexto.
Relativamente ao procedimento de ajustamento correlativo, introduzem -se alterações decorrentes do acolhimento das melhores práticas internacionais em caso de correção de lucros entre
empresas associadas, bem como do facto de a Lei n.º 120/2019, de 19 de setembro, ter introduzido novos mecanismos para resolução de litígios em matéria fiscal entre Estados -Membros da União Europeia.
Por fim, atenta a complexidade técnica associada à aplicação do princípio de plena concorrência, e a necessidade de perspetivar a sua aplicação evitando a dupla tributação internacional e os litígios dela emergentes, reitera -se a recomendação de, na aplicação da regulamentação sobre os preços de transferência, seguir as orientações constantes dos relatórios da OCDE que desenvolvem esta matéria. Neste quadro inserem -se para além das OECD Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations, na versão de julho de 2017, as subsequentes orientações, cuja adoção pelos países membros é objeto de recomendações aprovadas pelo Conselho desta organização internacional, nomeadamente as que resultam das ações do Projeto Base Erosion and Profit Shifting, incluindo as orientações relativas à aplicação do método do fracionamento do lucro e à abordagem aos intangíveis de difícil avaliação (publicadas em 2018) e às operações financeiras (publicadas em fevereiro de 2020). No caso particular da determinação do lucro tributável imputável a um estabelecimento estável, a aplicação do princípio de plena concorrência às relações entre este e a entidade da qual constitui estabelecimento estável, e com os demais estabelecimentos estáveis desta, deverá atender também às orientações vertidas nos relatórios da OCDE relativos à imputação de lucros a estabelecimentos estáveis, publicados em 2008 e 2010, aos comentários ao Modelo de Convenção da OCDE, bem como às observações de Portugal, aplicáveis às circunstâncias concretas, e às demais recomendações aprovadas pelo Conselho daquela organização internacional, conexas com este tema, nomeadamente as que resultam das ações do Projeto Base Erosion and Profit Shifting.